A Saúde e seus Determinantes Sociais

 DSS- Determinantes Sociais de Saúde

  • as condições de vida e trabalho dos indivíduos e de grupos da população estão relacionadas com sua situação de saúde.
  • Segundo a Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS), os DSS são os fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população.
  • Segundo a comissão homônima da Organização Mundial da Saúde (OMS) adota uma definição mais curta, segundo a qual os DSS são as condições sociais em que as pessoas vivem e trabalham.
  • São os fatores e mecanismos através dos quais as condições sociais afetam a saúde e que potencialmente podem ser alterados através de ações baseadas em informação. (Nancy Krieger (2001))
  • São as características sociais dentro das quais a vida transcorre. (Tarlov (1996))
Paradigmas explicativos dos problemas de saúde, em meados do século XIX...
  • a teoria miasmática
    • que conseguia responder às importantes mudanças sociais e práticas de saúde observadas no âmbito dos novos processos de urbanização e industrialização ocorridos naquele momento histórico
    • Virchow, um dos mais destacados cientistas vinculados a essa teoria, entendia que a “ciência médica é intrínseca e essencialmente uma ciência social” que as condições econômicas e sociais exercem um efeito importante sobre a saúde e a doença e que tais relações devem ser submetidas à pesquisa científica.
  • o extraordinário trabalho de bacteriologistas como Koch e Pasteur
    • A história da criação da primeira escola de saúde pública nos Estados Unidos, na Universidade Johns Hopkins, é um interessante exemplo do processo de afirmação da hegemonia desse “paradigma bacteriológico”.
    • o predomínio do conceito da saúde pública orientada ao controle de doenças específicas, fundamentada no conhecimento científico baseado na bacteriologia e contribuiu para “estreitar” o foco da saúde pública, que passa a distanciar-se das questões políticas e dos esforços por reformas sociais e sanitárias de caráter mais amplo.
    • estendeu-se por todo o país e internacionalmente. 
    • preponderância do enfoque médico biológico na conformação inicial da saúde pública como campo científico, em detrimento dos enfoques sociopolíticos e ambientais.
  • A definição de saúde como um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não meramente a ausência de doença ou enfermidade, inserida na Constituição da OMS no momento de sua fundação, em 1948, é uma clara expressão de uma concepção bastante ampla da saúde, para além de um enfoque centrado na doença
Década de 70 - A Conferência de Alma-Ata, coloca as atividades inspiradas no lema “Saúde para todos no ano 2000” recolocam em destaque o tema dos determinantes sociais.

Década de 80 - desloca a atenção para uma  concepção centrada na assistência médica individual

Decada de 90 - novamente dá lugar a uma ênfase nos determinantes sociais que se afirma com a criação da Comissão sobre Determinantes Sociais da Saúde da OMS, em 2005.

O estudo dos determinantes sociais da saúde...
  • observa-se um extraordinário avanço no estudo das relações entre a maneira como se organiza e se desenvolve uma determinada sociedade e a situação de saúde de sua população (ALMEIDA-FILHO, 2002). 
  • estudo das iniqüidades em saúde, ou seja, daquelas desigualdades de saúde entre grupos populacionais que, além de sistemáticas e relevantes, são também evitáveis, injustas e desnecessárias (WHITEHEAD, 2000)
  •  Segundo Nancy Adler (2006), podemos identificar três gerações de estudos sobre as iniqüidades em saúde.
    •  A primeira geração se dedicou a descrever as relações entre pobreza e saúde;
    •  A segunda, a descrever os gradientes de saúde de acordo com vários critérios de estratificação socioeconômica; 
    • A terceira e atual geração está dedicada principalmente aos estudos dos mecanismos de produção das iniqüidades.
  • pretende estabelecer uma hierarquia de determinações entre os fatores mais gerais de natureza social, econômica, política e as mediações através das quais esses fatores incidem sobre a situação de saúde de grupos e pessoas, já que a relação de determinação não é uma simples relação direta de causa-efeito.
Não basta somar os determinantes de saúde identificados em estudos com indivíduos para conhecer os determinantes de saúde no nível da sociedade.
  • os fatores individuais são importantes para identificar que indivíduos no interior de um grupo estão submetidos a maior risco, as diferenças nos níveis de saúde entre grupos e países estão mais relacionadas com outros fatores, principalmente o grau de eqüidade na distribuição de renda.
  • não basta somar os determinantes de saúde identificados em estudos com indivíduos para conhecer os determinantes de saúde no nível da sociedade. 
Abordagens para o estudo dos mecanismos através dos quais os DSS provocam as iniqüidades de saúde. 
  • A primeira delas privilegia os “aspectos físico-materiais” na produção da saúde e da doença, entendendo que as diferenças de renda influenciam a saúde pela escassez de recursos dos indivíduos e pela ausência de investimentos em infra-estrutura comunitária (educação, transporte, saneamento, habitação, serviços de saúde etc.), decorrentes de processos econômicos e de decisões políticas. 
  • Outro enfoque privilegia os “fatores psicosociais”, explorando as relações entre percepções de desigualdades sociais, mecanismos psicobiológicos e situação de saúde, com base no conceito de que as percepções e as experiências de pessoas em sociedades desiguais provocam estresse e prejuízos à saúde. 
  • Os enfoques “ecossociais” e os chamados “enfoques multiníveis” buscam integrar as abordagens individuais e grupais, sociais e biológicas numa perspectiva dinâmica, histórica e ecológica.
  • há os enfoques que buscam analisar as relações entre a saúde das populações, as desigualdades nas condições de vida e o grau de desenvolvimento da trama de vínculos e associações entre indivíduos e grupos. Esses estudos identificam o desgaste do chamado “capital social”, ou seja, das relações de solidariedade e confiança entre pessoas e grupos, como um importante mecanismo através do qual as iniqüidades de renda impactam negativamente a situação de saúde. 
O modelo de Dahlgren e Whitehead inclui os DSS...
  •  dispostos em diferentes camadas, desde uma camada mais próxima dos determinantes individuais até uma camada distal, onde se situam os macrodeterminantes.
  •  Apesar da facilidade da visualização gráfica dos DSS e sua distribuição em camadas, segundo seu nível de abrangência, o modelo não pretende explicar com detalhes as relações e mediações entre os diversos níveis e a gênese das iniqüidades. 
  • Como se pode ver na figura 1, os indivíduos estão na base do modelo, com suas características individuais de idade, sexo e fatores genéticos que, evidentemente, exercem influência sobre seu potencial e suas condições de saúde.
  • Na camada imediatamente externa aparecem o comportamento e os estilos de vida individuais. Esta camada está situada no limiar entre os fatores individuais e os DSS, já que os comportamentos, muitas vezes entendidos apenas como de responsabilidade individual, dependentes de opções feitas pelo livre arbítrio das pessoas, na realidade podem também ser considerados parte dos DSS, já que essas opções estão fortemente condicionadas por determinantes sociais - como informações, propaganda, pressão dos pares, possibilidades de acesso a alimentos saudáveis e espaços de lazer etc.
  • A camada seguinte destaca a influência das redes comunitárias e de apoio, cuja maior ou menor riqueza expressa o nível de coesão social que, como vimos, é de fundamental importância para a saúde da sociedade como um todo. 
  • No próximo nível estão representados os fatores relacionados a condições de vida e de trabalho, disponibilidade de alimentos e acesso a ambientes e serviços essenciais, como saúde e educação, indicando que as pessoas em desvantagem social correm um risco diferenciado, criado por condições habitacionais mais humildes, exposição a condições mais perigosas ou estressantes de trabalho e acesso menor aos serviços.
  •  Finalmente, no último nível estão situados os macrodeterminantes relacionados às condições econômicas, culturais e ambientais da sociedade e que possuem grande influência sobre as demais camadas
O modelo de Diderichsen e Hallqvist, de 1998, foi adaptado por Diderichsen, Evans e Whitehead (2001).
  •  enfatiza a estratificação social gerada pelo contexto social, que confere aos indivíduos posições sociais distintas, as quais por sua vez provocam diferenciais de saúde. 
  • No diagrama abaixo, (I) representa o processo segundo o qual cada indivíduo ocupa determinada posição social como resultado de diversos mecanismos sociais, como o sistema educacional e o mercado de trabalho.
  •  De acordo com a posição social ocupada pelos diferentes indivíduos, aparecem diferenciais, como o de exposição a riscos que causam danos à saúde (II); 
  • o diferencial de vulnerabilidade à ocorrência de doença, uma vez exposto a estes riscos (III);
  •  e o diferencial de conseqüências sociais ou físicas, uma vez contraída a doença (IV). 
  • Por “conseqüências sociais” entende-se o impacto que a doença pode ter sobre a situação socioeconômica do indivíduo e sua família.



Intervenções sobre os determinantes sociais da saúde.
  • O modelo de Dahlgren e Whitehead e o de Diderichsen permitem identificar pontos para intervenções de políticas, no sentido de minimizar os diferenciais de DSS originados pela posição social dos indivíduos e grupos.
    • o primeiro nível relacionado aos fatores comportamentais e de estilos de vida indica que estes estão fortemente influenciados pelos DSS, pois é muito difícil mudar comportamentos de risco sem mudar as normas culturais que os influenciam.
    • O segundo nível corresponde às comunidades e suas redes de relações. Como já mencionado, os laços de coesão social e as relações de solidariedade e confiança entre pessoas e grupos são fundamentais para a promoção e proteção da saúde individual e coletiva.
    • O terceiro nível se refere à atuação das políticas sobre as condições materiais e psicossociais nas quais as pessoas vivem e trabalham, buscando assegurar melhor acesso à água limpa, esgoto, habitação adequada, alimentos saudáveis e nutritivos, emprego seguro e realizador, ambientes de trabalho saudáveis, serviços de saúde e de educação de qualidade e outros.
    • O quarto nível de atuação se refere à atuação ao nível dos macrodeterminantes, através de políticas macroeconômicas e de mercado de trabalho, de proteção ambiental e de promoção de uma cultura de paz e solidariedade que visem a promover um desenvolvimento sustentável, reduzindo as desigualdades sociais e econômicas, as violências, a degradação ambiental e seus efeitos sobre a sociedade (CNDSS, 2006; PELEGRINI FILHO, 2006).
  • O outro modelo, proposto por Diderichsen et al., permite também identificar alguns pontos de incidência de políticas que atuem sobre os mecanismos de estratificação social e sobre os diferenciais de exposição, de vulnerabilidade e de suas conseqüências.
    •  a intervenção sobre os mecanismos de estratificação social seja de responsabilidade de outros setores, ela é das mais cruciais para combater as iniqüidades de saúde. Aqui se incluem políticas que diminuam as diferenças sociais, como as relacionadas ao mercado de trabalho, educação e seguridade social, além de um sistemático acompanhamento de políticas econômicas e sociais para avaliar seu impacto e diminuir seus efeitos sobre a estratificação social.
    • O segundo conjunto de políticas busca diminuir os diferenciais de exposição a riscos, tendo como alvo, por exemplo, os grupos que vivem em condições de habitação insalubres, trabalham em ambientes pouco seguros ou estão expostos a deficiências nutricionais.. Aqui se incluem também políticas de fortalecimento de redes de apoio a grupos vulneráveis para mitigar os efeitos de condições materiais e psicossociais adversas.
A Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS)
  • Comissão foi estabelecida em 13 de março de 2006, através de Decreto Presidencial, com um mandato de dois anos.
  •  é uma resposta ao movimento global em torno dos DSS desencadeado pela OMS, que em março de 2005 criou a Comissão sobre Determinantes Sociais da Saúde (Commission on Social Determinants of Health - CSDH), com o objetivo de promover, em âmbito internacional, uma tomada de consciência sobre a importância dos determinantes sociais na situação de saúde de indivíduos e populações e sobre a necessidade do combate às iniqüidades de saúde por eles geradas.
  • está integrada por 16 personalidades expressivas de nossa vida social, cultural, científica e empresarial.
  • reconhece que a saúde é um bem público, construído com a participação solidária de todos os setores da sociedade brasileira
  • têm como referência o conceito de saúde, tal como a concebe a OMS - “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não meramente a ausência de doença ou enfermidade” - e o preceito constitucional de reconhecer a saúde como um “direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (artigo 196 da Constituição brasileira de 1988)
  • Três compromissos vêm orientando a atuação da Comissão: 
Compromisso com a ação: implica apresentar recomendações concretas de políticas, programas e intervenções para o combate às iniqüidades de saúde geradas pelos DSS. 
Compromisso com a eqüidade: a promoção da eqüidade em saúde é fundamentalmente um compromisso ético e uma posição política que orienta as ações da CNDSS para assegurar o direito universal à saúde.
Compromisso com a evidência: as recomendações da Comissão devem estar solidamente fundamentadas em evidências científicas, que permitam, por um lado, entender como operam os determinantes sociais na geração das iniqüidades em saúde e, por outro, como e onde devem incidir as intervenções para combatê-las e que resultados podem ser esperados em termos de efetividade e eficiência.

Os principais objetivos da CNDSS são: 

 produzir conhecimentos e informações sobre os DSS no Brasil; 
 apoiar o desenvolvimento de políticas e programas para a promoção da eqüidade em saúde; 
 promover atividades de mobilização da sociedade civil para tomada de consciência e atuação sobre os DSS.

Referências:
A Saúde e seus Determinantes Sociais . PAULO MARCHIORI BUSS e  ALBERTO PELLEGRINI FILHO

Nenhum comentário:

Postar um comentário