O Desastre na perspectiva Sociológica e Psicológica

  • O artigo tem por objetivo revisar e discutir conceitos de desastre na perspectiva de autores da Sociologia e da Psicologia.
  • No âmbito da Sociologia a palavra desastre abrange fenômenos delimitados no tempo e no espaço, capazes de causar danos físicos, perdas, rupturas sociais e mudanças no funcionamento da rotina diária. 
  • No âmbito da Psicologia, o termo, que faz menção a eventos súbitos e com potencial traumático delimitados no tempo e no espaço, refere-se a fenômenos coletivos que geram alto grau de estresse e provocam consequências/reações psicológicas nos envolvidos. 

NO ÂMBITO DA PSICOLOGIA

  •  o interesse pelos desastres, segundo Puy e Romero (1998), foi suscitado no contexto da Segunda Guerra MundiaL
  •  organismos oficiais do governo norte-americano financiavam estudos em Psicologia do Trauma, com o objetivo de extrapolar os resultados obtidos em contextos de desastres, aplicando-os às situações bélicas
  • McFarlane & Norris (2006) afirma que embora os desastres tenham os mesmos estressores da guerra, diferem em dimensões temporais.
  • O desenvolvimento da Psicologia no campo dos desastres tem dado ênfase à resiliência psicológica e aos comportamentos adaptativos diante dos novos cenários do pós-desastre. 
  •  o foco de interesse tem se deslocado para as intervenções e avaliações com base na comunidade, dentro de princípios consistentes com os modelos públicos de saúde mental (Dodge, 2006; Reyes, 2006c)
  • Há um grande empenho no desenvolvimento tanto de teorias quanto de ferramentas de avaliação e intervenção em desastres como, por exemplo, a intervenção em crise (Dass-Brailsford, 2010)
Segundo (Ager, 2006; Dass-Brailsford, 2010; Dodge, 2006) a ênfase está...
  • no fortalecimento da resiliência comunitária, em consonância com as características culturais de cada contexto.
  • no atendimento das necessidades psicossociais.
  • no  cuidado com a saúde mental tanto dos profissionais quanto dos seus beneficiários.
A Psicologia dos Desastres ou Psicologia nas/em emergências e desastres:
  • área ainda em desenvolvimento no Brasil e um campo ainda jovem, inclusive nos países desenvolvidos (Reyes, 2006a)
  • não há formação específica na área e a Psicologia dos Desastres não está incluída como disciplina no currículo dos cursos de psicologia, deixando a qualificação dos profissionais no enfrentamento dos dessas situações a desejar.
  • Recentemente (08/05/2013) o Conselho Federal de Psicologia publicou nota técnica sobre a atuação de psicólogos em situações de emergência e desastre relacionadas com a Política Nacional de Defesa Civil. 
  • faz-se necessário que os serviços, em seus territórios de abrangência, estejam preparados e organizados para participar ativamente de ações de prevenção, preparação, resposta e reconstrução nessa situações (CFP, 2013). 
  • segundo Reyes (2006b), é um campo da Psicologia que em situações de desastre atua de modo a oferecer respostas de curto prazo ao estresse agudo, enfatizando intervenções com base na comunidade.
  • utiliza técnicas como as da intervenção em crise, visando o gerenciamento do estresse e com ênfase na diminuição da excitação emocional, na resolução de problemas e na adoção de estratégias de coping efetivas.
Distinção entre Psicologia do Trauma e a Psicologia dos Desastres:
  • não são áreas intercambiáveis entre si.
  • a Psicologia do Trauma tem muito a oferecer aos sobreviventes dos desastres, orientando e desenvolvendo ações com vista a reduzir a exposição à traumatização nesses contextos, ações que, na maioria das vezes, dizem respeito ao gerenciamento da situação de crise instalada com o desastre.
  • McFarlane e Norris (2006) tenham enfatizado que um desastre não pode ser entendido como sinônimo de trauma, ainda assim consideram como uma das características deste tipo de evento o potencial para o trauma. 

Universo das Perdas em Desastres...

  • Para Reyes (2006a), os desastres costumam ocasionar enormes perdas materiais e humanas, as quais, na maioria das vezes, tendem a ser rapidamente esquecidas. 
  • as pessoas afetadas podem ter perdido familiares, amigos, estrutura de apoio comunitário, trabalho e outros bens de valor para a sobrevivência.
  •  O psicólogo dos desastres necessita ser um expert não apenas em trauma, mas também em perdas e em mudança comunitária.
  • é preciso conhecer como trabalhar em e com comunidades de maneira coordenada e em colaboração com diferentes profissionais e organizações. 
  • embora definam desastres como eventos agudos, esses autores reconhecem também que nem todos se desenvolvem da mesma maneira, e que podem ser cíclicos
  • além do potencial traumático, a exposição prolongada à ameaça de um desastre e a não previsibilidade do seu término - como ocorre com as secas - são situações geradoras de altos níveis de estresse, interferindo na saúde psicológica e influenciando a percepção de segurança quanto ao futuro (McFarlane & Norris, 2006). Desastres causados por mudanças embientais(seca).
  • o desastre não é compreendido apenas como um evento de início agudo, como propuseram McFarlane e Norris (2006), mas muito mais, como uma expressão aguda da vulnerabilidade social. 

DESASTRES, EMERGÊNCIAS E ACIDENTES

  •  Quarantelli (1998) enfatizou que não existe consenso sobre o conceito de desastre.
  • Britton (1986) considerou desastres, emergências e acidentes como períodos de crise social, caracterizados por diferentes graus de estresse coletivo.
  • GarciaRenedo (2008) sistematizou as ideias de Britton e acrescentou o termo “catástrofe” como sendo o evento de maior grau de estresse coletivO.
  • ACIDENTE estaria no extremo de menor estresse coletivo, sendo um evento em que a ruptura aconteceria para um grupo muito específico de vítimas. (Garcia-Renedo,2008)
  • EMERGÊNCIA uma situação de crise interferiria nas atividades realizadas por um determinado grupo de pessoas. (Garcia-Renedo,2008)
  • DESASTRE implicaria num maior número de pessoas afetadas, assim como na ruptura da maioria das estruturas sociais e da infraestrutura comunitária, como acontece no caso dos terremotos. (Garcia-Renedo,2008)
  • CATÁSTROFES para se referir à ruptura de todas as estruturas sociais de uma sociedade, como, por exemplo, o que ocorreu no Tsunami do Sudeste Asiático e no contexto das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki. (Garcia-Renedo,2008)
Critérios que diferenciam esses eventos, segundo Garcia-Renedo (2008)

  1. número de pessoas implicadas,
  2. capacidade de resposta do sistema,
  3.  ruptura e danos nos sistemas sociais 
Atributos subjetivos que devem ser considerados:
  • o potencial de afetar as crenças das pessoas, ocasionando a perda do sentido de invulnerabilidade e da crença num mundo justo, e o de gerar ansiedade diante da possibilidade de morte e sentimento de insegurança quanto ao futuro (Garcia-Renedo, 2008; Paez, Fernández & Martín Beristain, 2001; Reyes, 2006c). 
Os Desastre segundo Britton (1986)
  • Seus impactos são mediados pelos elementos que compõem a realidade onde eles ocorrem.
  • Abrange fatores de natureza econômica e política que interferem não apenas na capacidade de enfrentamento de suas consequências, mas na perpetuação dos múltiplos fatores que compõem uma situação de risco.
  • podem ser entendidos como um sistema com características dinâmicas, constituído por uma combinação de fatores de risco.
DEFINIÇÕES DE DESASTRE... 

NA PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA:

Segundo Fritz (1961, p. 312) - Análise Social
  •   Desastres são eventos, observáveis no tempo e espaço, no qual as sociedades ou suas subunidades (comunidades ou regiões) sofrem danos físicos e perdas e/ou rupturas no funcionamento de sua rotina. Ambas, causas e consequências desses eventos estão relacionadas com as estruturas sociais e processos das sociedades ou suas subunidades.
  • partem da avaliação de danos físicos e perdas, rupturas sociais e mudanças no funcionamento da rotina diária.
  • fez referência à sua temporalidade, ou seja, considerou-os como eventos observáveis no tempo e no espaço
Segundo Britton (1986, p. 254) - Análise Social
  • Desastre é um produto social como expressão da vulnerabilidade da sociedade humana que depende da interação entre os seres humanos e sua utilização do espaço físico e social.
  • um desastre não seria um evento isolado que incide sobre a realidade, mas fruto da interação entre os seres humanos e a utilização do ambiente. 
  • destaca o fato de que os desastres não acontecem desvinculados do contexto social, ou seja, num contexto onde não há interação entre a pessoa e o ambiente não pode existir um desastre.
NA PERSPECTIVA PSICOLÓGICA

Segundo Quarantelli (1985, p. 50) - Análise Psicossocial
  • Quando, numa ocasião de crise, a demanda por ação excede a capacidade de resposta. A ênfase está no esforço coletivo para dar conta da crise particular por meio da restauração das capacidades ao nível das demandas.
  • Abrange contextos (física, econômica, estrutural, social e de outras naturezas)
Segundo McFarlane e Norris (2006, p.04) - Análise Psicossocial
  • Um evento com potencial traumático o qual é experimentado coletivamente, com início agudo e delimitado no tempo. Desastres podem ser atribuídos a causas naturais, tecnológicas e humanas.
  • evidencia duas características, ou seja, o início abrupto e o potencial traumático
  • estão  presentes diferentes causas para os desastres, como causas humanas, naturais e tecnológicas
Segundo García-Renedo, Gil Beltrán e Valero Valero (2007, p. 40) - Análise Psicossocial
  • Uma situação traumática que gera um alto grau de estresse aos indivíduos de uma sociedade ou uma parte dela, devido à ação de um agente em uma comunidade vulnerável (natural, humano ou uma combinação de ambos), produzindo uma alteração no funcionamento, tanto em nível comunitário como individual, assim como uma série de reações e consequências psicológicas nas pessoas envolvidas. As demandas criadas excedem os recursos habituais de respostas disponíveis na comunidade.
  • apontam a vulnerabilidade e a alteração no funcionamento social como anteriormente descritas no âmbito da Sociologia (Britton, 1986), e acrescentam na sua definição as consequências e reações psicológicas sofridas pelos envolvidos.
Considerações sobre Desastre...
  • não é uma palavra simples de ser definida,
  • não pode ser compreendido desvinculado do contexto no qual ele ocorre.
  • devem ser consideradas as variáveis físicas, sociais, políticas, econômicas e outras que possam estar implicadas
  • Um processo que tem sua origem na interação entre seres humanos e seu contexto social (Britton, 1986)
  • Os desastres desafiam a capacidade humana de resposta (Quarantelli, 1985), podendo trazer consigo perdas (Fritz, 1961)
  • Eles podem ser cíclicos ou escalonados, de início súbito e com grande potencial traumático (GarciaRenedo et al., 2007; McFarlane & Norris, 2006)
  •  o que determinará as suas consequências e a capacidade de um determinado grupo social para enfrentá-los são as circunstâncias que envolvem os processos do desastre. 
  • são processos que, além de evidenciar a capacidade de enfrentamento de indivíduos e grupos, despertam para a necessidade de transformação da realidade social.
 REFERÊNCIAS

O DESASTRE NA PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA E PSICOLÓGICA1 Eveline Favero2 Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Cascavel-PR, Brasil Jorge Castellá Sarriera Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre-RS, Brasil Melina Carvalho Trindade Domus - Centro de Terapia de Casal e de Família, Porto Alegre-RS, Brasil

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