domingo, 7 de março de 2021

A busca do significado - Gestalt-Terapia

  •  qualquer forma de psicoterapia oculta e revela, ao mesmo tempo, uma teoria do homem. Ela procura através do ser humano, do seu pensar, do seu agir, induzir um sistema de comportamento.
  •  Ciência e conduta andam juntas desde os primórdios da humanidade.
  •  muito antes que a ciência formal existisse, já os homens executavam tarefas com a segurança que seus próprios pensamentos e sentidos lhes ditavam.
"...as coisas se auto-revelam, elas contêm um apelo interno de auto-revelação e de auto-realização: "a água diz: bebe-me"; "o fruto diz: come-me"; "a mulher diz: ame-me". As coisas em si não se autocomplicam, elas simplesmente são e se exibem, cristalinamente." (pg.17)
  • A natureza, no entanto, é mais complexa do que aquilo que a simples informação direta e sensorial pode informar.
 "O processo de pensar destruiu a unidade do mundo primitivo", e com isto a ciência formal começa a se implantar. A ciência passa a disciplinar a percepção, a disciplinar os desejos, a exigir uma maior exatidão no estabelecimento e compreensão dos fatos." (pg.17)

"... no campo da psicologia, como ciência que estuda o comportamento dos seres vivos, ou seja, a relação entre natureza animada e inanimada, entre natureza, vida e mente. O homem é todo ele um ser de relação com. Imerso no universo, tudo diz respeito a ele e com tudo ele se encontra em relação, consciente ou inconsciente." (pg.17)
  • Surge a posição gestáltica, que propõe uma integração de quantidade, ordem e significado, como correspondendo àquela globalidade que define e caracteriza a relação homem-universo. 
"A simples percepção do fenômeno não me coloca em contato direto com a realidade. É necessário que o fenômeno se desvele e que se note o como de seu desvelar." (pg.20)
  • fica mais clara a proposta da Gestalt-terapia em lidar prioritariamente com o quê e o como.
  • "o quê" me revela o fenômeno, "o como" o descreve, colocando o psicoterapeuta na condição de lidar com a qualidade do fenômeno real. 
  • Quanto mais o quê (quantum) se revela, mais se pode ter uma visão unitária do processo como um todo, o que equivale a dizer perceber sua qualidade. 
  • A emoção, por exemplo, tem um quantum, a percepção de sua intensidade, me revela a qualidade do que está acontecendo aqui e agora. 
"...o discurso unitário de explicação das relações homem-mundo deve ser necessariamente holístico. As coisas estão presentes inteiras. O limite real das coisas é sua própria realidade, que pode ser incompleta, se vista dentro de um conceito de projeto, mas que será completa se vista atualizada aqui e agora."(pg.21)
  •  A ordem não é apenas uma propriedade da vida, mas também da natureza. 
  • Uma mesa com papéis amontoados por quem a utiliza pode significar a "ordem" melhor para esta pessoa. Se alguém a ordena, colocando as coisas em lugares diferentes, esta nova ordem pode dificultar o trabalho de quem utiliza a mesa.
  • A pergunta é: ordem com relação a quê. Uma pessoa dita "certinha" está em ordem; alguém, no entanto, livre, solto, espontâneo, pode ser chamado de "não em ordem". Se ambos estão bem consigo mesmos, podemos dizer que ambos estão em ordem? 
"O processo psicoterapêutico visa a alcançar esta ordem, esta harmonia, não importando a quantidade com que se apresenta. Se existe ordem, existem também a quantidade e qualidade desejadas."
  • o mais fundamental destes conceitos é o de significado e valor, como pertencentes às ciências da mente. Aqui como diz Koffka, está uma das raízes mais profundas da Teoria da Gestalt. 
  • raciocínio para a psicoterapia: o cliente é entendido a partir do momento em que ele é visto como um todo, vindo de um todo e presente em um todo. 
  • O cliente é como uma sinfonia. É importante escutar cada uma de suas notas (seus problemas). que só se fazem inteligíveis quando vistas no seu todo, na sua relação dinâmica de parte para parte. 
"...quando a ação psicoterapêutica é orientada para o todo do cliente, cada uma de suas partes está sendo mexida, considerada; quando é orientada para uma parte do cliente, p. ex., para uma energia localizada na respiração, toda a pessoa está sendo atingida, porque a relação não é apenas de causa e efeito, mas uma relação existencial entre as partes e o todo, entre cada nota e a sinfonia."(pg.23)
  • As coisas, entretanto, existem e co-existem conosco independentemente da existência que lhe queiramos atribuir.
  • As coisas têm um fluxo de energia que lhes é próprio e tendem a se autorrealizar da maneira mais perfeita, integrando elementos após elementos. 
  • As coisas e pessoas tentam se integralizar, se globalizar, se totalizar com um impulso que lhes é próprio. 
Como diz Koffka: 
"Aplicar a categoria de causa e efeito significa descobrir que partes da natureza se encontram nesta relação. Analogicamente, aplicar a categoria de Gestalt significa descobrir a que partes da natureza pertencem, como partes, a todos funcionais, descobrir suas respectivas posições nestes todos, seu grau de relativa independência e de articulação dos todos maiores em subtodos (1931b)."(4)
  • contém um apelo visível do significado que nasce da relação parte-todo, causa-efeito.
  • é a relação parte-todo, todo-parte que indicará o caminho a seguir.
  • O caminho inicial parece ser o da busca do significado e da ordem existentes no ser. 
"O psicoterapeuta se encontra frequentemente diante de informações cuja quantidade (quantum) poderia levar a conclusões de compreensão de uma situação" (pg.25)
  • p. ex., um choro abundante e contínuo do cliente que fala da perda do pai.
    • Existe aí uma outra variável que é aquela da qualidade (qualitas) deste choro
    • Tem-se a sensação de que quanto maiores forem os pormenores deste choro mais sua qualidade poderá definir-se. 
      • A qualidade poderá ser boa ou má. 
      • O que irá definir esta qualidade é o significado do choro, que nasce não do choro em si, mas da relação entre choro e realidade total.
PRESSUPOSTOS FILOSÓFICOS DA GESTALT-TERAPIA
  • A psicoterapia tem uma proposta de um ponto de vista psicodinâmico.
  • Deve-se refletir a  teoria da psicoterapia, sob o ponto de vista existencial-fenomenológico.
  • Uma reflexão filosófica a partir do sentido do homem no mundo, a partir de elementos onde teorias como a do Campo, a Holística, a Gestáltica, juntamente com a práxis psicoterapêutica, tentam iluminar esta vasta área do conhecimento humano, dificultado na compreensão pela própria reflexão do que é e de como se é, existindo. 
  • A proposta desta reflexão é precedida por uma reflexão humanista, existencial-fenomenológica
GESTALT-TERAPIA EHUMANISMO
  • Humanismo...
    •  tem sido a grande tentativa do homem de compreender-se e de fazer-se compreendido.
    • o homem...
      • tem estado permanentemente em luta consigo e com outros homens, na eterna tentativa de se firmar e de ser reconhecido como pessoa.
      • busca a harmonização como centro de sua expectativa.
      •  Está permanentemente à procura da compreensão de seu próprio sentido. 
    • designa uma concepção do mundo e da existência, que tem o homem como centro. 
" O homem é naturalmente o centro das coisas, do universo, porque, como diz Heidegger, só o homem existe, as coisas são. O homem é o único ser que tem uma maneira característica de se fazer, de se realizar." (pg. 28)

" Pitágoras, cinco séculos antes de Cristo, dizia: "o homem é a medida de todas as coisas". Isto não significa ser o homem o senhor absoluto e prepotente do universo, mas que o universo deve ser pensado a partir do homem." (pg.28)

"Falta ao homem uma reflexão profunda sobre si próprio. Nesta perspectiva, fica mais claro ainda o nístico de Sócrates: "Conhece-te a ti mesmo."
  • Conhecer a si próprio...
    •  é experimentar o próprio poder e os próprios limites; 
    • é a partir de si próprio que o homem caminha para compreender o mundo e utilizar o mundo na compreensão de si próprio. 
    • é uma proposta de se autogerir: de evoluir a partir de dentro, conscientizando-se, momento por momento. 
"Não se pode negar que em toda forma de psicoterapia se esconde uma visão do homem. A Gestalt-terapia se coloca do lado das psicoterapias humanísticas, o que significa que contém e promove a ideia do homem como centro, como valor positivo, como capaz de se autogerir e regular-se."(pg.29)

"O humanismo é uma teoria do homem...
  •  psicoterapia de base humanística é o homem criando a si mesmo, existindo, tomando posse de si e do mundo e não a aplicação de uma teoria no homem. 
  • Este homem transcende à teoria do homem. E só assim ele pode ser entendido como centro.
Uma psicoterapia, preocupada com a valorização do humano...
  • procura diretamente lidar com o que de positivo tem a pessoa, procura lidar com seu potencial de vida (saúde, beleza, força, etc.), 
  • procura fazer com que o cliente tome, de fato, posse de si mesmo e do mundo.
  • Tal postura não significa que não se tente compreender o sentido das limitações, das fronteiras, da morte, no contexto da psicoterapia, pois, psicoterapia tem que ser expressão e compreensão  da própria vida. 
  • É a postura humanística que, sem esquecer os limites pessoais, os fracassos e impossibilidades de mudanças, aqui e agora, procura fazer uma reflexão a partir do positivo, do criativo, do que é ainda potencialmente transformador; enfim, daquilo que, talvez sem o perceber, o cliente tem à sua disposição, como principal e, às vezes, única porta de saída para sua recuperação e renascimento.  
"Estamos ainda longe de pensar, com suficiente radicalidade, a essência do ser. Conhecemos o agir apenas como o produzir de um efeito. Sua realidade efetiva é avaliada segundo a utilidade que oferece. Mas a essência do agir é o consumar. Consumar significa: desdobrar alguma coisa até a plenitude de sua essência: levá-la à plenitude: producere. Por isto, apenas pode ser consumado, em sentido próprio, aquilo que já é. O que, todavia, já é, antes de tudo, é o ser."(3) (HEIDEGGER apud  RIBEIRO, pg.30).
  • A nossa proposta de psicoterapia da Gestalt com relação ao cliente....
    • é que ele aja com toda a sua radicalidade, longe de ser um mero produzir efeitos, conseguir resultados imediatos, supõe um consumar a essência. 
    • a essência significa um produzir existencial permanente, um fazer recurso a potencialidades desconhecidas ou não usadas, um desdobrar-se à procura da própria totalidade significativa.  
    • deve estar atenta à realização plena destes três momentos: agir, pensar e expressar-se (Heidegger)
    • A finalidade da psicoterapia é levar o cliente à sua consumação, isto e. a desdobrar-se até a plenitude de sua essência, ou seja, levá-lo à sua plenitude no agir, no pensar, no expressar-se pela linguagem.
    • o homem todo inteiro é o sujeito do processo psicoterapêutico. Não basta lidar ou com sua linguagem ou com o que ele faz ou pensa.
    • A Gestalt é. Tem um apelo interno de desvendar-se, de se deixar descobrir, tocar, analisar.
    •  Heidegger dizia que encarregar-se de alguma coisa, de uma pessoa, significa ouvi-la, querê-lo: ouvir o ser, querê-lo, penetrar no ser através da Gestalt que ele é.
 " dentro de uma visão humanística, ficam mais claras as relações do homem com Deus, com a lei, com o bem e o mal, com os valores. 

Como diz Heidegger: "O único pensamento que se quer impor é que as mais altas determinações humanísticas da essência do homem ainda não experimentaram a dignidade propriamente dita do homem".(6) (pg. 31)
  •  uma reflexão existencialista...
    • como um modo característico de agir e reagir à realidade, nos dará elementos para um quadro referencial que se vai diferenciando cada vez melhor. 
    • Essa visão ajuda na compreensão de um  processo gestáltico psicoterapêutico
Gestalt- terapia...
  • um caminho e uma forma de se expressar diante da vida, estudar e confrontar a filosofia existencialista 
  • permite uma reflexão aprofundada de sua proposta de compreensão do mundo visto por nós do ponto de vista psicológico. 
  • Seus princípios e pressupostos nos ajudam a fazer aquela transposição de mensagens que estão à base de nossa preocupação
  • um modo específico de estar no mundo e de lidar com ele.  
  • o homem como um ser particular, concreto, com vontade e liberdade pessoais, consciente e responsável.
  •  O existencialismo é a expressão de uma experiência individual, singular: trata diretamente da existência humana.
  •  significa a necessidade de se tentar compreender o indivíduo a partir de sua singularidade, de seu manifestar-se subjetivo. Conhecer é, portanto, fazer um apelo à existência, à subjetividade.
  •  ver o homem como um ser particularizado, singularizado no seu modo de ser e de agir, concebendo-se como único no universo e individualizando-se a partir do encontro verdadeiro entre sua subjetividade e sua singularidade
"O homem é singular... Apenas ele tem consciência da sua singularidade. Portanto, o homem é a categoria central da existência. A existência individual, assim a concebe Kierkegaard, é para ser vivida... Kierkegaard exalta o concreto, o singular, o homem enquanto subjetividade."(8) (pg.32)
  • A consciência é...
    •  viva, livre, ela existe voltada para as coisas, ela existe orientada de forma imediata para as coisas. 
    • Ela sempre visa algo. 
    • Todo ato humano visa um objeto, não ocorre no vazio, por isto Husserl dizia: "Toda consciência é consciência de alguma coisa". 

REFERENCIAS:
RIBEIRO, jorge Ponciano. Gestalt-Terapia Refazendo um caminho. 8ª edição revisada. Summus editorial. 

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