quinta-feira, 3 de junho de 2021

O exame do estado mental e suas transformações

 

  • Sendo a psicologia a ciência que trata  dos estados e processos mentais ou o estudo do comportamento humano, e a psicopatologia o estudo das disfunções psicológicas e comportamentais, é comum, no primeiro caso, o acréscimo “da mente normal”, e, no segundo, “o estudo da mente anormal”.
  • Esse é um campo científico em que o movimento dos observadores, dos ob servados, dos instrumentos de observação (teorias e técnicas) e da própria cultura vem acelerando, com constantes transformações. Tudo se move.
O Exame do Estado Mental (EEM)
  • É a  avaliação acurada e sis temática (descrição, identificação, reconheci men to e nomeação adequada) de sintomas objetivos (sinais diretamente observáveis) e subjetiv os (sintomas não observáveis diretamente) dos transtornos mentais, das crises vitais (evolutivas ou acidentais) e condições similares (sem transtorno mental, mas com sintomas presentes) e das condições clínicas de outra natureza (doenças físicas ou somáticas, especialmente neurológicas, efeitos colaterais de medicamentos, etc.).
  • Seus dados são obtidos em entrevistas abertas ou semiestruturadas.
  • O Present Status Examination (PSE) (Royall et al., 1992), Exame do Estado [Mental] Atual, é obtido por meio de entrevista estruturada com 140 itens. 
  • É essencial que o estudante ou profissional envolvido nesse trabalho de avaliação saiba que amaior parte dos sintomas psicopatológicos, mesmo os graves (como delírios e alucinações), é subjetiva, e, mais ainda, depende de avaliação subjetiva do próprio entrevistador. 
  • É o paciente que “se sente triste”; é o examinador que avalia esse sentimento, afeto ou estado do humor. Essa avaliação é realizada durante e por meio de entrevistas clínicas, sejam de avaliação diagnóstica inicial, sejam de tratamento.
  • Para Akiskal (1986), o EEM seria análogo ao exame físico praticado na medicina, em que são avaliadas sistematicamente todas as funções do corpo (visão, audição e outros sentidos, aparelhos circulatório, respiratório e outros).
  • A realização do EEM requer ciência e arte, dependendo de conhecimentos e experiência prática, preferentemente desenvolvida em vários settings (consultórios privados, ambulatórios públicos, hospitais, etc.) e com populações heterogêneas (quanto a idade, condição socioeconômica, religião, gênero, psicopatologia, diagnóstico, etc.), sendo os exames continuamente revisados.
  • é preciso ter alguma fa miliaridade com outros modelos teóricos: neurobiológico (Andreasen e Kandel); psicanalíti cos (Freud, Hartmann, Erikson, Klein, Winnicott, Kohut e outros); cognitivo-comportamental (be ha viorismo, teorias da aprendizagem, psicologia cog nitiva); interpessoal (psicobiologia e teorias do apego/separação); culturalistas ou neofreudianos (Sullivan e Horney); sistêmico familiar (ci bernética, teoria dos sistemas, teoria da comunicação); existencial-humanista (Maslow e Rogers); e, por fim, o modelo social (Hollingshead e Redlich nos Estados Unidos; Thomas Main e Maxwell Jones na Inglaterra; Ulysses Pernambucano, no Brasil), muitodiferente das “antipsiquiatrias” (Laing, Cooper, Szasz e Basaglia).
  • O EEM exige a avaliação de uma pessoa nos seus aspectos sadios e patológicos, em cada uma das funções mentais ou psíquicas.
  • É um exame descritivo em corte transversal, focado no momento da avaliação; porém, a expressão presente ou atual inclui os últimos 30 dias na vida do examinado, de acordo com o PSE (Medical Research Council [MRC], 1983), o que garante o registro de perturbações da consciência no EEM, mesmo que elas tenham ocorrido há um mês e já não estejam presentes na ocasião da realização do exame.
  • Avalia: atenção, sensopercepção, memória, orientação, consciência, pensamento, linguagem, inteligência, afetividade, conduta.

Síndromes, Transtornos e Doenças Mentais

Um mesmo transtorno mental pode se expressar clinicamente por diferentes síndromes, de acordo com o momento da evolução ou de acordo com o paciente, sua personalidade prévia e seu ambiente familiar.

  • um mesmo paciente com transtorno esquizofrênico pode manifestar uma síndrome ansiosa no período prodrômico do surto,11 uma síndrome alucinatória ou delirante durante o surto, e uma síndrome depressiva após o surto.
  • Diferentes transtornos mentais podem se expressar em uma mesma síndrome:

  • uma síndrome maníaca pode ser a manifestação do  transtorno bipolar, da sífilis cerebral, de uma psicose cerebral orgânica por corticosteroides ou, ainda, de uma disfunção ou desinibição frontal ou pré-frontal 
  • Fenomenologia, Filosofia Existencial e Karls Jaspers

    • Semiologia -  na linguística, é a ciência de todos os sistemas de signos, símbolos e de todos os sistemas de comunicação social, antigamente era sinônimo de semiótica (de semeion, signo), o estudo científico das propriedades dos sistemas de comunicação, naturais ou artificiais.  De acordo com Houaiss e Vilar (2001), na medicina e em outras atividades clínicas, semiologia é o meio e o modo de examinar um paciente, verificando sinais e sintomas.
    • Jaspers (1985) teria denominado essa atitude de “penetração empática”. 
    • Huber (2002) caracteriza a atitude fenomenológica proposta por Jaspers como uma articulação entre a capacidade de se comunicar com o paciente, por meio da empatia, e a capacidade de um distanciamento, por meio da imparcialidade e da objetividade.
    • A fenomenologia relaciona-se e se complementa com as filosofias existencialistas de Kierkegaard, Husserl, Heidegger e Sartre (Abbagnano, 1999). O enfoque fenomenológico considera inseparáveis o sujeito e sua doença. Embora com diferenças, todas compartilham a ideia central da análise do modo de ser do homem no mundo, em determinada situa ção. Por essa análise, denominada existencial, entenda-se a análise, em termos de possibilidades, das situações mais comuns ou fundamentais em que o homem vem a se encontrar, incluindo certos aspectos  considerados “negativos” da experiên cia humana, como a dor, o fracasso, a doença e a morte, aspectos habitualmente excluídos das abordagens românticas do positivismo do século XVIII e do idealismo.


    Referências:

    HUTZ et al, 2016. cap. 9 - Cláudio Maria da Silva Osório

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