Capítulo I- O Behaviorismo ignora a consciência, os sentimentos e o estados mentais, não atribindo qualquer papel ao eu ou a consciência do eu? Luciane da Costa Barros

O Behaviorismo é comumente mal interpretado devido à sua preocupação com o rigor científico. Um dos maiores equívocos está na falsa concepção de que o Behaviorismo ignora os sentimentos, a consciência e os estados mentais (Skinner, 2003)

Inicialmente, entre os anos de 1930 e 1944, os estudos de Skinner estavam voltados para os comportamentos publicamente observáveis. Foi em 1945, ano que é considerado o marco de inicio do Behaviorismo Radical, que Skinner incluiu a análise da subjetividade em seus trabalhos (Costa. 2002). 

Para explicar a subjetividade. Skinner (1990) recorre às contingências ambientais que, segundo ele, atuam nos níveis filogenético. ontogenético e cultural - níveis de determinação do comportamento que serão abordados nos capítulos 2 e 3. 

A subjetividade é denominada, por Skinner, de eventos privados que, além de cnglobar os comportamentos encobertos (acessíveis diretamente apenas ao próprio indivíduo), inclui os estímulos internos (condição corporal e resposta emocional) (Skinner, 1998). 

Skinner trata a subjetividade ou eventos privados do mesmo modo que os comportamentos públicos, pois, para os behavioristas, cognição, estados mentais e emoção são comportamentos e, como tais, são funções do ambiente - sendo ambiente entendido como tudo que ocorre no universo que é capaz de afetar o organismo (Skinner, 1998). 

A condição corporal (dor, frio, fome) e a resposta emocional (raiva, tristeza, alegria) são partes do universo que afetam o indivíduo. Entretanto, os estímulos internos não são autônomos, pois estão sempre atrelados a um evento externo antecedente. O Behaviorismo Radical recorre sempre ao ambiente externo para explicar o comportamento, rejeitando as concepções internalistas que recorrem ao próprio indivíduo como tentativa de explicar o comportamento (Tourinho, 1997).

Em Ciência e Comportamento Humano (1998), Skinner fala da vida privada como aquela que é construída na relação do individuo com a comunidade verbal pertencente ao seu meio cultural. Por isso. para compreender e analisar a subjetividade é preciso investigar o contexto ao qual está relacionada. 

No processo de instalação dos eventos privados no repertório comportamental do indivíduo, é preciso que ele se comporte publicamente e que a comunidade verbal o ensine a discriminar e nomear o evento privado. Por exemplo, uma criança que está com dor de barriga provavelmente colocará a mão na barriga com expressões faciais de dor (rosto franzido). Isso permitirá que outra pessoa responda discriminativamente e diga para ela que, o que está sentindo é dor de barriga. Nesse sentido. Skinner, 1998) argumenta que todo comportamento antes de ser privado, deve ser apresentado publicamente. 

Contudo, com palavras que designam sentimentos, o aprendizado não ocorre de maneira tão fácil, pois os comportamentos que são expressos publicamente quase nunca coincidem com o que se passa no mundo privado. As palavras que uma pessoa utiliza para responder o que está sentindo foram adquiridas através da comunidade verbal, e esta não sabia exatamente o que ela estava sentindo (Skinner. 2002). 

Skinner (2002) mostrou que as palavras aprendidas para expressar sentimentos começaram com metáforas, como uma forma de mostrar o que se passava internamente através de algo público que fosse semelhante; por exemplo, uma pessoa que se sente traída compara tal sentimento com um punhal enfiado no peito. Houve uma transferência do público para o privado. 

Numa análise do comportamento, segundo Skinner (2002), não precisamos utilizar os nomes que designam sentimentos se pudermos acessar diretamente os eventos públicos que causaram tais eventos privados. 

Ao invés de dizer que alguém está deprimido, podemos dizer que não existe nada de reforçador no ambiente desse indivíduo. Isso não significa que o Behaviorismo não leva em consideração os sentimentos. O que o Behaviorismo não aceita são os eventos privados como determinantes do comportamento; eles não são aceitos como causa pois, como foi afirmado anteriormente, existe sempre um evento externo antecedente (Skinner, 2003). 

Para ilustrar, costumamos dizer que a raiva é o que nos motiva a “brigar” com alguém, mas ninguém fica com raiva sem que algo externo ao sujeito tenha ocorrido antes de tal evento privado, como uma batida de carro, uma ofensa proferida ou um dia com temperatura excessivamente elevada. 

É fácil atribuir a causa do comportamento aos sentimentos porque estes ocorrem ao mesmo tempo em que estamos nos comportando ou mesmo antes de nos comportarmos,. formando um elo na cadeia comportamental (Skinner, 2 0 0 2 ). 

Skinner (2002) esclarece outro ponto que facilita esse engano - o fato de, na maioria das vezes, as pessoas não estarem conscientes das contingências ambientais que estão controlando seus comportamentos.

Considerando que a crítica inclui a não-atribuição de papel à consciência, faz-se necessário elucidar de um modo mais especifico como a consciência é vista pelo Behaviorismo Radical.

Skinner (1998) aborda a consciência como a capacidade que o ser humano tem de descrever seu comportamento, identificando a sua relação com as variáveis que o determinam.Ter consciência ou estar consciente refere-se então ao mesmo fenômeno - a capacidade que uma pessoa tem de falar sobre o seu comportamento. Quando isso é possível, podemos dizer que tais atos ou comportamentos são conscientes (Baum. 1999). 

O comportamento de falar também pode ser consciente ou não. Será consciente quando a pessoa que se comportou for capaz de repetir o que foi dito (Baum. 1999). Entretanto. Skinner (1998) revela que, na maioria das vezes, o homem é incapaz de reconhecer tais variáveis, pois estas podem ser sutis a ponto de não despertarem a atenção do indivíduo. Da mesma forma, pode não haver uma razão específica para que este indivíduo se comporte discriminativamente a ponto de tomar consciência daquela relação. Além disso, as variáveis que nos afetam são muitas e discriminar sob controle de qual delas estamos nos comportando não é uma tarefa fácil. 

Em síntese, quando nos comportamos ou quando estamos aprendendo um comportamento, não nos damos conta do processo como um todo, o que tem como conseqüência a atribuição da função de originador do comportamento a um agente interno - o EU - referindo-se ao próprio homem como responsável pelo comportamento (Skinner, 1998). 

Quando as concepções internalistas, referem-se a um EU como o causador de uma ação, esse EU não coincide com o organismo físico. É como se o corpo apenas se comportasse, mas quem o dirige é o EU, e não importa se esse EU é inconsistente (que muda de um momento pra outro), pois um único EU é capaz de comportar diferentes ações (Skinner, 1998).

Para Skinner (1998), o conceito de EU não é essencial em uma análise do comportamento porque ele se baseia nas variáveis ambientais. Considera o EU um mero artifício para simplificar a relação funcional “causa e efeito’', já que trabalhar com os dados ambientais exige uma explicação de como se dá as relações entre eles. 

A concepção behaviorista de EU, que nada se assemelha às concepções internalistas. revela que o EU está relacionado com a cultura na qual os repertórios comportamentais vão ser instalados em cada indivíduo a partir da sua interação com o ambiente. 

De acordo com as variáveis ambientais, o indivíduo aprenderá a se comportar de diferentes maneiras em diferentes situações (Skinner, 1998). O que se tomará próprio de cada indivíduo será a forma como se comportará diante de uma dada situação, visto que a história de reforçamento se diferencia de pessoa para pessoa. 

Em suma. o EU não é um agente interno ao homem e causador de uma ação, mas sim comportamentos instalados a partir da história de reforçamento do indivíduo em interação com o meio cultural. 

Podemos perceber claramente, ao longo de todo o capitulo, a ênfase que o Behaviorismo dá ao ambiente, mas isso não torna as criticas dirigidas a ele pertinentes

O Behaviorismo Radical atribui ao EU e a subjetividade (eventos privados) o lugar de ser efeito do ambiente e dos comportamentos que ele produz, e não o de ser causa

Os eventos privados podem fazer parte de uma cadeia de comportamento, mas não o determinam. O estimulo que produz o comportamento é sempre ambiental externo. Logo, não há gravidade alguma em deixar de atribuir ao EU, ou aos eventos privados, o papel de causador do comportamento já que somos a todo o momento afetados pelo ambiente.



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