- investiga os efeitos da colonização na produção de subjetividade e na produção de conhecimento, em especial seu desdobramento na formação dos profissionais de psicologia.
- pretende demonstrar a fragilidade da formação em psicologia no Brasil e os impactos do racismo nas subjetividades negras.
É imprescindível ao psicólogo estar atento e sensível ao contemporâneo. É tempo de ampliarmos cada vez
mais a concepção de que o que se passa no mundo nos
atravessa e produz subjetividade (GUATTARI, 1992).
- o sofrimento psíquico é político
- precisa levar em consideração as opressões de gênero e da sexualidade.
Emmy Von N., primeira paciente de Freud, pede a ele que fique em silêncio
e a escute (BREUER; FREUD, 1895/1995).
- pediu que parasse com suas técnicas, hipnose e sugestão na época, e a ouvisse
- Parafraseando-a: “respeite meu lugar de fala, encontre seu lugar de escuta”
- escuta passa a ser a principal tecnologia terapêutica de diferentes abordagens clínicas
- ouvir o paciente, é ouvir o sintoma que o adoece
- ouvir o sintoma, é ouvir o mundo que o produz.
Nietzsche (1882) ouviu e decretou a morte de Deus
- O homem é o protagonista, assume o comando de sua própria vida.
É tempo de decretarmos o
fim do colonialismo. Sair da grande noite, operar a descolonização radical de Fanon (MBEMBE, 2017)
- descolonização do insconsciente é imprescindível
- capacidade de descolonizar territórios existenciais, o inconsciente.
- Racismo, machismo, lgbtfobia são produtos da máquina colonial de produção de subjetividade, produtos que operam um corte na realidade e que dividem o mundo num arranjo que compõe quem exerce violência e quem a sofre.
- Opressão do branco sobre o negro, do homem sobre a mulher, do cis sobre a/o trans, do hétero sobre o homossexual.
- Este mundo tal como o conhecemos se funda na violência
Numa sociedade estruturada na violência, sua reestruturação não pode se dar senão por meio do que Mombaça (2016) chamou de “redistribuição da violência.
- a violência anticolonial é uma violência criadora
- a redistribuição dessa violência começa com a violência da marca
- Nomear o branco de branco, marcar que o lugar de onde ele fala é o de uma pessoa branca, que os autores que ele lê são brancos, que o pensamento dele é branco.
- Fazer isso sem subjugar a ele e aos seus um regime de escravidão, fazer isso sem que seus jovens brancos sejam assassina dos a cada 23 minutos no Brasil.
- Apenas marcar: você é branco.
- A esse respeito, Mignolo (2008, p. 297) afirma que “ao ligar a descolonialidade com a identidade em política, a opção descolonial revela a identidade escondida sob a pretensão de teorias democráticas universais”
Em se tratando da formação e do exercício da psicologia no Brasil, promover sua descolonização também parte
por marcar que a psicologia brasileira é branca (VEIGA,
2018a).
- colonizados por uma branquitude-patriarcal-europeia
- a colonização do pensamento, homens-brancos-europeus foram tomados como sabedores das questões filosóficas, existenciais, políticas, econômicas, artísticas e psicológicas de todos os povos.
- O pensamento colonial é universalista, mas nega que o seja como um ato de resistência sintomático de negação da própria doença
- Os currículos de psicologia nas universidades brasileiras são impregnados de colonialismo
Ao limitar-se às conceituações brancas e europeias
sobre saúde mental e sofrimento psíquico, a psicologia
brasileira deixa de contemplar e tratar adequadamente
54% da população do país, composta por negros e negra.
- A subjetividade negra é ignorada na grande maioria das graduações em psicologia, e um dos efeitos diretos disso são pacientes negros serem vítimas de racismo pelos profissionais que deveriam acolhê-los e, ao mesmo tempo, sentirem que não estão sendo compreendidos em suas questões e nem escutados como pertencentes a um povo que durante mais de 300 anos foi escravizado e que só há 130 anos foi liberto.
- 1930 - a psicanalista Virgínia Bicudo realizou uma vasta pesquisa com negros em São Paulo, que resultou na sua dissertação de mestrado Atitudes raciais de negros e mulatos em São Paulo.
- Frantz Fanon, em seu rabalho clínico e acadêmico, escreveu, nos anos 1940, o livro Pele negra, máscaras brancas, referência nos estudos da saúde mental da população negra.
- 1960/1970, no trabalho de psicólogos negros como Wade Nobles e Naim Akbar surge, nos Estados Unidos, a Black Psychology como sendo a construção de teorias e práticas em psicologia clínica tendo como referência as subjetividades negras e a ancestralidade africana.
- 1980, a psicóloga e psicanalista brasileira Neusa Santos Souza escreveu o livro Tornar-se negro, em que fez uma releitura de conceitos fundamentais da psicanálise a partir da experiência negra
A saúde mental de vidas negras importa
- A subjugação dos africanos à condição de escravos produziu efeitos devastadores em suas subjetividades.
- Os negros estão inseridos num país que implementou e que perpetua com múltiplos dispositivos uma política de embranquecimento da população.
- Vivemos num país antinegro, e isto tem efeitos nocivos sobre as subjetividades negras. O termo subjetividade, aqui, refere-se à produção de modos de ser, estar, sentir e perceber o mundo (VEIGA, 2015)
- De acordo com a psicanalista, o branco como ideal e como marca do desejo faz com que o negro se engaje em formas de se aproximar desse ideal branco
Efeito Diáspora
- Chamo de “efeito diáspora” a sensação de não se sentir pertencente ao ambiente onde se vive, a dificuldade de ser genuinamente acolhido e incluído nas dinâmicas sociais numa posição equânime com os demais membros da sociedade e não numa posição de subalternidade.
- A experiência da negritude é marcada pelo desprezo e pelo ódio que a branquitude projetou sobre as vidas negras desde a escravidão até os dias de hoje
- Ódio que, introjetado nas subjetividades negras, resulta num doloroso processo de auto-ódio.
- Culpa e auto-ódio atravessam na dolorosa experiência de elaboração do trauma de uma violência.
- Os abusos do racismo sobre os corpos e as subjetividades negras têm como um de seus efeitos a culpa pela condição socioeconômica precária em que a maior parte da população negra se encontra;
- o auto-ódio por toda a raça negra e por si mesmo por sentir-se falho, menor, sem qualidades diante dos privilégios da branquitude.
- Uma direção de tratamento para a cura desses afetos que corroem a subjetividade negra está em devolver para a branquitude, ou seja, para o abusador, a responsabilidade pela violência do racismo.
- O movimento de deslocamento da posição de auto-ódio para a posição de empoderamento passa pela experimentação do afeto de raiva como sendo o trilho pelo qual o que ficou represado e introjetado na subjetividade negra culpando-a pela condição em que se encontra e fazendo-a sentir-se inferior possa escoar por toda a malha subjetiva do tecido social.
- A subjetividade negra, liberta do auto-ódio, ganha espaço para a construção de outras relações consigo, com os demais negros, com a branquitude; a sensação permanente de não se sentir em casa, em vez de ser paralisante, se torna motor para a criação de modos singulares de existência diaspórica e matéria-prima para a produção artística, cultural, intelectual e política.
Como tratar dos efeitos do racismo na subjetividade
negra numa relação terapêutica em que a marca do terapeuta, ser branco, é o que legitima as violências ao ser
preto do paciente?
- descolonização da psicologia
- colocar em questão o próprio lugar do psicólogo, situar suas marcas, seu lugar de fala, porque é desse lugar que ele exerce a escuta.
Há uma dimensão da subjetividade
negra que só outro negro consegue acolher.
- Um negro, diz Molefi Asante (2009, p. 102), “é uma pessoa que participou dos quinhentos anos de resistência à dominação europeia”.
- Devido aos efeitos dos privilégios de se ter uma pele branca na subjetividade dos psicólogos brancos, a problemática do sofrimento racial, que maltrata as subjetividades negras, não é compreendida ou escutada com todas as suas implicações. “A alma do branco está corrompida”, alerta-nos Fanon (2008, p. 118).
O horror do embranquecimento
- negação do valor da pessoa negra
- perpetuação a partir do aparato político-midiático em que pessoas brancas estão na posição de poder e de referência da beleza, em detrimento às pessoas negras, surge, no negro, o desejo de se aproximar da brancura
- cria condição psicológica debilitante
- embranquecimento é o principal alimento do auto-ódio.
- comportamentos autodestutivos como fuga psíquica de uma realidade profundamente antinegra.
Pulsão Palmarina
- prática clínica de psicólogos pretos com pacientes pretos (Nobles)
- é o desejo de ser africano e livre
- é ser Livre das engrenagens coloniais que nos mantêm presos a um esquema sociopolítico que nos adoece
- é ser parte de uma totalidade cósmica e espiritual que rege o universo, somos elementos da natureza do mund
A colonização e seus desdobramentos
- A escravidão e o embranquecimento afastaram os negros de nossas origens, não apenas por meio do apagamento dos caminhos e de parte da história de nossos ancestrais, mas também por meio da criação de uma narrativa sobre nós, que teve como efeito sentirmos vergonha, culpa, falta em relação a nós mesmos e ao povo ao qual pertencemos. Esse tempo acabou.
- É preciso dizer não às narrativas brancas e hegemônicas e traçar as próprias narrativas a partir do trabalho que nossos ancestrais e nossos mais velhos em vida vêm produzindo ao longo dos séculos.
- Dizer não a uma certa psicologia, branca demais para acolher e tratar dos efeitos do racismo em suas subjetividades, e se aprofundamos no estudo para o desenvolvimento de uma Psicologia Preta no Brasil.
- Descolonizar implica estilhaçar as velhas sedimentações culturais, intelectuais e políticas e, mais do que resgatar, criar um senso de valor próprio sobre si mesmo e sobre o povo ao qual se pertence.
https://www.scielo.br/j/fractal/a/NTf4hsLfg85J6s5kYw93GkF/?format=pdf
Nenhum comentário:
Postar um comentário